Monday, November 24, 2014

Elegia 1938 (Poema da obra Sentimento do mundo), de Carlos Drummond de Andrade

Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações no encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.

Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
e sabes que, dormindo, os problemas de dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.

Caminhas entre mortos e com eles conversas
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.

Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.

Thursday, November 20, 2014

em campo

volto as origens
a escrita incentivada pela tristeza
pelo pavor e pelo medo
volto pq sinto que toda vez que venho pra cá
é como se eu deixasse parte da minha angústia
nessas palavras que quase não domino mais

a vida é uma eterna batalha
e me sinto um guerreiro sem tropa
sem paramédicos
sem arqueiros para cobrir minha corrida

me sinto um soldado que
não está correndo por uma nação,
mas por apenas uma vida
minha própria sobrevivência

é uma guerra moderna
é a nova era das lutas
a luta interna
a luta mental
a luta árdua
e diária