Monday, March 21, 2011

Costa Norte

Era a primeira noite do outono, ele estava na sua estréia para o ano de 2011, com 18 graus de ventos fortes e arrepiantes. Um casal passeava a pé por um deck, o rapaz segurando uma garrafa de vinho cabernet franc, e a rapariga seu maço de cigarros. Gostavam da sensação que aquele lugar transmitia. A lua cheia iluminando o mar, o cheiro de maresia, de plantas e natureza.
Na metade do passeio resolveram sentar e ouvir as ondas batendo nas rochas. Procuravam um lugar ermo, procuravam fugir da cidade agitada, dos gringos, das músicas da moda e de toda maluquice mundana. Ficaram ali parados por minutos, em silêncio, só observando.
Outras pessoas passavam por lá, quem sabe atrás da mesma paz, ou atrás de um lugar bom para se drogar, ou eram apenas turistas. Não sei. Haviam casais, solteiros, amigos e estranhos.
O casal gostava de reparar em quem passava, criar uma nova vida para aqueles personagens, criar histórias, personalidades. Contos horripilantes, contos de amor, contos de aventura e contos de ficção.

-Aquele homem tem cara de psicopata não acha? - disse a rapariga ao namorado – apontando para o terceiro homem que acompanhava um possível casal de gay.

-Sim, pode ser.. E aquele casal é bem estranho também não? A trilha do deck já está acabando, não tem mais nada para lá, onde será que eles estão indo?

-Acho que aquele homem que estava atrás, de roupa social, e um andar suspeito, é mesmo um assassino, e está levando aqueles dois outros caras para um lugar bem obscuro. E vai matar eles! - rindo da brincadeira, a menina acende seu cigarro, e um vento forte apaga a chama do isqueiro, e tira de sua boca vermelha o cigarro que cai entre a mata.

O rapaz ri e se levanta para buscar, o que era o último cigarro do maço, sendo assim algo sagrado, eles não poderiam desperdiçá-lo.

-Droga! -ele disse- Esse vento está foda, não consigo achar! Tive que pular aqui em baixo para nada.

-Entre na mata, tá vendo? Do lado daquela árvore? Acho que está ali.

-Tá, vou ver. Agora fica aí. Que vou aproveitar para dar uma mijada, não tome todo o vinho.

E a namorada obediente, se vira em direção ao mar, liga seu mp3 e coloca bang bang de Nancy Sinatra para ouvir. Fica imaginando como o possível assassino está dilacerando suas vítimas e toma mais um gole do vinho. Passam-se mais de cinco minutos e o rapaz ainda não voltou. Deve estar bolando uma brincadeira, ela pensou. Já se prevenindo de um possível susto.
Mais cinco minutos e nada dele aparecer. A menina se levanta, e grita “Felipeeee!” para a mata. Mas não recebe resposta alguma. “Pare com essa brincadeira!!” E novamente, o único som que saiu do meio das árvores, eram dos grilos e outros estralos.
Toma num gole só a garrafa de vinho, para dar coragem, pula para baixo do deck e vai procurar seu companheiro.
A noite parecia mais fria que antes, seu shorts jeans pouco a protegia do frio e das plantas afiadas do chão. O relevo era íngreme e na diagonal, um barranco mal projetado pela natureza. Achou o maldito cigarro, mas não viu um sequer resquício dos passos do rapaz. Subiu a ladeira com dificuldade, praticamente engatinhando com as mãos na terra, esfolando a palma nas pedras.
Quando chegou ao topo, olhou para os lados, para baixo, nada. De súbito uma força agarra a menina pela barriga e arrasta seu corpo pela mata. Não tinha nenhuma pessoa, nenhum animal perto dela, apenas essa força invisível. Ela começa a chorar, não entendo nada, não era a bebida, não era nada, além do inexplicável. Seu corpo é levado por alguns metros, e a solta. Ela levanta a blusa para ver sua barriga que doía muito, e tinha marcas perfeitas de mão e dedos.
De pé, corre em direção a trilha do deck, resvala e caí rolando pelo morro. Abrindo os olhos vê um homem em sua frente, com sapatos lustrados e paletó azul de veludo. Ela o reconhece como o “assassino misterioso”, e ele ajuda a moça a levantar, passando uma estranha calma e paz.
Ele pede para ela o acompanhar e voltaram para cima do deck. Foram até o final do trajeto, onde havia uma imensa luz branca e clara, caminham mais uns metros, entrando no mar e nesta luz. Até o momento em que as lâmpadas do deck vão se apagando, gradativamente, e uma grande escuridão invade a costa, paralisando o mar, o tempo, o vento e a vida.